Entenda o fenômeno do “roubo de vento” e seus impactos na engenharia de energia global

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Nos últimos anos, cresceu o número de construções de parques eólicos offshore ao redor do mundo –  que são aquelas estações de geração de energia localizadas no meio do mar, onde os ventos são mais constantes e intensos. Ao mesmo tempo, cientistas, governos e investidores de negócios também começaram a observar o surgimento de um fenômeno bastante curioso, o que eles apelidaram de “roubo de vento”. Antes que você possa imaginar que trata de um crime, esclarecemos que isso tem mais a ver com o efeito físico conhecido como efeito esteira.

Acontece que o roubo de vento pode causar um impacto desastroso no planejamento e eficiência dos sistemas de energia eólica global. Esclarecemos melhor o assunto no artigo a seguir, no Engenharia 360!

O que é roubo de vento?

Atualmente, a engenharia está correndo contra o tempo para realizar a descarbonização do setor energético global. É claro que isso tem impulsionado mais o crescimento acelerado da energia eólica offshore. Porém, alguns parques eólicos vêm sendo afetados pelo chamado roubo de vento. Na prática, tem a ver com o fato dessa extração de energia cinética do vento pelas turbinas afetar, de algum modo, outros parques localizados na mesma direção do fluxo de vento. Isso reduz a velocidade das turbinas, criando o que os cientistas chamam de efeito esteira.

A saber, um rastro como esse de vento pode se estender por dezenas de quilômetros ou até chegar a 100 km de distância, a depender da densidade e do tamanho do parque eólico. E se o outro parque concorrente estiver localizado a favor do vento, o primeiro sofre uma redução significativa de eficiência. Inclusive, pesquisas indicam perdas de até 10% ou mais na produção de energia.

Resumindo, quando dois ou mais parques estão posicionados de forma que suas esteiras se sobrepõem, o resultado é uma redução acumulativa na produção total de energia.

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Imagem reproduzida de Wind-Turbine and Wind-Farm Flows A Review via USP
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Imagem reproduzida de Port´e-Agel via SBA – Sociedade Brasileira de Automática

Como ocorre o efeito esteira e quais as suas consequências?

Efeito esteira é quando turbinas eólicas retiram energia do vento ao girarem, criando uma região atrás delas onde o ar move-se com menor velocidade e maior turbulência. 

Já reparou, ao observar um parque eólico, que as torres eólicas não ficam uma em frente à outra, mas sim em posições intercaladas? Também já reparou que essas torres são voltadas para um determinado sentido, na direção do vento predominante? Então, um segundo parque eólico precisaria estar mais distante do primeiro, para não sofrer perdas significativas em sua geração de energia. Mas, especialmente na região entre Reino Unido e países nórdicos, os projetos vêm sendo implantados muito próximos uns aos outros, dada a pressão por atingir metas climáticas ambiciosas.

Nessa região, entre o mar do Norte e o mar Báltico são instaladas turbinas modernas e gigantes, com paz que ultrapassam os 100 metros, criando rastros mais longos e impactantes. O que acontece quando um parque cheio dessas torres está muito próximo do outro é que toda a zona de vento fica enfraquecida – aí está o problema, como bem sabemos a energia eólica é literalmente extraída do vento. A consequência é a menor produção de energia, a diminuição do retorno financeiro dos projetos e o comprometimento da estabilidade da rede energética.

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Imagem de Enrique em Pexels

Por que o roubo de vento preocupa os governos?

A situação dos roubos de vento está tão crítica em algumas partes do mundo que já virou motivo para disputas legais e diplomáticas. Podemos citar o governo norueguês, que vem questionando o regulamento dos direitos de uso de áreas marítimas para geração de energia por concessões. Também os casos de disputas judiciais entre operadores de parques eólicos no Reino Unido, Dinamarca, Holanda e mais por conta de ocorrências de efeito e esteira. 

Do ponto de vista da engenharia, o efeito esteira representa hoje um obstáculo significativo para a maximização da capacidade instalada de geração eólica. Acontece que, em determinado momento, nos comprometemos como comunidade a atingir as emissões zero e, diante disso, vários governos optaram por investir ao máximo em sua capacidade eólica offshore. A perspectiva era de que, até 2030, já tivéssemos o triplo da capacidade que temos agora. No entanto, o espaço marítimo é limitado e o risco de interferências entre parques é considerável.

O único jeito de evitar esse tipo de problema é a engenharia realizar antes simulações mais precisas, detalhar modelos atmosféricos avançados e desenvolver estratégias de posicionamento inteligentes.

Infelizmente, como bem sabemos, às vezes, na pressa de cumprir uma promessa, o ser humano age com desrespeito às boas práticas de planejamento, colocando em risco a proteção ambiental e a viabilidade financeira dos empreendimentos.

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Imagem de Kindel Media em Pexels

Como a engenharia pode evitar o colapso energético renovável?

É claro que a engenharia pode desempenhar um papel crucial na mitigação dos efeitos do roubo de vento, que tanto vem afetando a eficiência dos parques eólicos e, consequentemente, levando ao colapso energético renovável. Podemos citar algumas ideias:

  • Aprimoramento das simulações atmosféricas que possam ajudar a prever e otimizar o impacto das esteiras desde a fase de planejamento dos projetos de parques eólicos. Como exemplo, os modelos desenvolvidos pela Universidade de Manchester e Universidade de Tecnologia de Delfi. 
  • Criação de regulamentações mais claras sobre o uso compartilhado do recurso eólico, semelhantes às normas para recursos como pesca em águas internacionais, garantindo uma utilização sustentável e equitativa.
  • Inovação no design de turbinas com controle dinâmico de orientação e ajuste de pitch, que ajudam a minimizar a formação de esteiras ou a redirecioná-las, aumentando eficiência operacional dos parques.
  • Lançamento de novas tecnologias avançadas de simulação climática em alta resolução para prever com precisão os impactos de novos projetos sobre os parques eólicos existentes, facilitando o planejamento de expansões futuras.

Claro que todas essas abordagens de engenharia podem garantir a sustentabilidade e a estabilidade dos sistemas energéticos renováveis frente aos desafios ambientais e operacionais complexos. Porém, nada disso adiantará se não houver cooperação internacional no planejamento dos parques eólicos, evitando que turbinas posicionadas muito próximas uma das outras aumentem um efeito esteira, comprometendo a eficiência energética.

Veja Também: Energia Eólica: Impactos Ambientais Desconhecidos


Fontes: BBC, Tempo – METEORED.

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