Jornalista é adicionado a grupo no Signal com Donald Trump e descobre planos de guerra ultrasecretos

Imagine acordar em um dia normal, verificar seu celular e descobrir que você foi incluído, por engano, em um grupo de mensagens com os principais assessores de segurança nacional do presidente dos Estados Unidos. Parece algo saído de uma série de espionagem, mas foi exatamente o que aconteceu com Jeffrey Goldberg, editor-chefe da revista The Atlantic. Em uma falha de segurança sem precedentes, Goldberg teve acesso direto a planos de guerra, discussões estratégicas e até mensagens privadas do alto escalão do governo americano através do aplicativo de mensagens Signal.

A história, revelada na última segunda-feira (24), expõe uma falha crítica de segurança nacional que permitiu ao jornalista acompanhar em tempo real o planejamento de ataques militares contra alvos dos rebeldes Houthis no Iêmen. O mais surpreendente? Ninguém do grupo, que incluía figuras como o vice-presidente JD Vance e o secretário de Defesa Pete Hegseth, percebeu a presença do intruso digital por dias.

Isso mostra que não importa quão avançada e sofisticado seja o sistema de criptografia usado nos aplicativos de mensagens. O fator humano sempre será o elo mais frágil de qualquer tecnologia e de qualquer sistema. Sempre vai ter alguém desatento o suficiente para clicar em um link infectado, para fornecer dados importantes em uma conversa ou para adicionar um jornalista a um grupo hiper secreto do governo dos Estados Unidos.

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Como tudo começou

Em 11 de março, Goldberg recebeu uma solicitação de conexão no Signal de alguém identificado como Michael Waltz, o conselheiro de segurança nacional de Donald Trump. Inicialmente cético, o jornalista aceitou o convite, considerando a possibilidade de que poderia ser realmente o funcionário do governo querendo discutir assuntos relevantes.

Dois dias depois, ele foi adicionado a um grupo chamado “Houthi PC small group” – uma referência ao “Principals Committee”, termo usado para designar o comitê de altos funcionários de segurança nacional nos EUA. O grupo incluía 18 pessoas, entre elas:

  • Marco Rubio (Secretário de Estado)
  • Pete Hegseth (Secretário de Defesa)
  • JD Vance (Vice-presidente)
  • Tulsi Gabbard (Diretora de Inteligência Nacional)
  • John Ratcliffe (presumivelmente da CIA)
  • Susie Wiles (Chefe de Gabinete da Casa Branca)
  • Stephen Miller (identificado apenas como “S M”)

Signal

Mesmo considerando a possibilidade de uma farsa ou operação de desinformação, Goldberg ficou impressionado com a verossimilhança das mensagens, que pareciam refletir com precisão o estilo e posicionamento político de cada participante.

Quando a ficção virou realidade

O que parecia um possível engano ou até mesmo uma elaborada trollagem para comprometer um jornalista se revelou assustadoramente real na manhã de 15 de março. À medida que as mensagens se intensificaram, Goldberg começou a receber detalhes operacionais de um ataque militar iminente:

Às 11h44, a conta identificada como ‘Pete Hegseth’ postou no Signal uma ‘ATUALIZAÇÃO DA EQUIPE’. Não vou citar esta atualização, ou certas outras mensagens subsequentes. As informações contidas nelas, se tivessem sido lidas por um adversário dos Estados Unidos, poderiam ter sido usadas para prejudicar militares e pessoal de inteligência americanos“, escreveu Goldberg em seu relato.

Às 13h45 do mesmo dia, exatamente como descrito nas mensagens que Goldberg havia lido, começaram os bombardeios em território iemenita. O jornalista assistiu ao desenrolar dos acontecimentos em tempo real, confirmando através do noticiário que os ataques estavam realmente ocorrendo conforme os detalhes compartilhados no grupo.

As mensagens no grupo revelaram mais do que apenas planos militares. O vice-presidente JD Vance expressou claramente seu desgosto com a necessidade de proteger interesses europeus: “Eu apenas odeio salvar a Europa de novo“, escreveu ele, referindo-se ao fato de que 40% do comércio europeu passa pelo Canal de Suez, enquanto apenas 3% do comércio americano utiliza a rota bloqueada pelos Houthis.

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Hegseth concordou prontamente: “Eu compartilho totalmente do seu desprezo pelos aproveitadores europeus. É PATÉTICO“. Essa troca de mensagens expõe a visão da atual administração sobre as relações transatlânticas e o papel dos EUA como protetor das rotas marítimas internacionais.

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Violações graves de segurança nacional

A utilização do Signal para comunicações de alta sensibilidade representa uma violação séria dos protocolos de segurança do governo americano. Especialistas consultados por Goldberg apontaram possíveis infrações a várias leis, incluindo:

  • Violações da Lei de Espionagem, que regula o manuseio de informações de “defesa nacional”
  • Descumprimento das leis federais de preservação de registros, já que Waltz configurou algumas mensagens para desaparecer após uma semana ou quatro
  • Uso de canais não aprovados para compartilhamento de informações classificadas

Para comunicações sensíveis, o governo dos EUA normalmente utiliza sistemas seguros como a SIPRNet (Rede Secreta de Roteadores de Protocolo de Internet) ou realiza reuniões presenciais em instalações especialmente projetadas conhecidas como SCIF (Instalação de Informação Compartimentada Sensível).

Quando o caso veio à tona, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, Brian Hughes, confirmou a autenticidade das mensagens: “Esta parece ser uma cadeia de mensagens autêntica, e estamos revisando como um número inadvertido foi adicionado à cadeia“, escreveu Hughes em resposta ao jornalista.

Trump, questionado sobre o incidente, afirmou desconhecer o assunto, mas logo depois fez publicações ridicularizando a revista The Atlantic em sua rede social Truth Social. O jornal The New York Times classificou o ocorrido como uma “falha excepcional” de segurança.

William Martin, porta-voz de Vance, tentou minimizar as discordâncias expostas no grupo: “O vice-presidente apoia inequivocamente a política externa desta administração. O presidente e o vice-presidente tiveram conversas subsequentes sobre este assunto e estão em completo acordo.

Um precedente preocupante

Trump

Este caso levanta questões sérias sobre como a administração Trump lida com informações sensíveis de segurança nacional. A revelação é particularmente irônica considerando a campanha agressiva de Trump contra Hillary Clinton por seu uso de um servidor de e-mail privado para assuntos oficiais durante seu tempo como Secretária de Estado.

Eu nunca vi uma violação como essa“, escreveu Goldberg. “Não é incomum que funcionários da segurança nacional se comuniquem pelo Signal. Mas o aplicativo é usado principalmente para planejamento de reuniões e outros assuntos logísticos — não para discussões detalhadas e altamente confidenciais de uma ação militar pendente.

O fato de que nenhum participante notou a presença do jornalista no grupo por vários dias — mesmo após ele ter saído voluntariamente, o que gerou uma notificação automática — sugere um nível alarmante de descuido com protocolos básicos de segurança.

Essa falha de segurança sem precedentes revela as vulnerabilidades que podem surgir quando oficiais do governo contornam sistemas seguros estabelecidos em favor de aplicativos comerciais, mesmo aqueles com recursos de criptografia avançados como o Signal.

Fonte: The Atlantic

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