Justiça não consegue bloquear R$ 2,1 milhões de banco usado por golpistas contra prefeitura em SP


Município fez transferência milionária para golpistas que se passavam pela Le Card, administradora do vale-alimentação dos servidores municipais. Executivo de Pirassununga diz que está buscando “outros meios para reaver valores” junto à Polícia Civil. Câmara de Pirassununga abre investigação para golpe de R$ 2,1 milhões na prefeitura
A Justiça teve uma “tentativa infrutífera” de bloquear os R$ 2,181 milhões perdidos pela Prefeitura de Pirassununga em um golpe sofrido no mês de fevereiro. A informação foi divulgada nesta segunda-feira (7) na ação ingressada pelo município na 3ª Vara da cidade.
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Em 31 de março, uma liminar do juiz Jorge Corte Júnior determinou o bloqueio do valor em contas do Banco Rendimento. A instituição bancária foi usada pelos criminosos, que abriram conta se passando pela empresa Le Card, administradora do vale-alimentação dos servidores municipais. (entenda o caso abaixo)
A 3ª Vara de Pirassununga tentou o bloqueio da quantia em 21 instituições bancárias cujo Banco Rendimento possivelmente teria saldo. Algumas responderam à Justiça que não havia montante positivo, enquanto em outras não foram encontradas contas ativas.
“Fica a parte autora intimada acerca da tentativa de bloqueio infrutífera”, informou a Justiça no processo. Ao g1, a prefeitura informou que “a Procuradoria do município está verificando outros meios juntamente com a Polícia Civil para reaver esses valores e identificar os responsáveis pela fraude”.
O g1 entrou em contato com o Banco Rendimento, mas não houve retorno até a última atualização desta reportagem.
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Relembre o caso
Prefeitura de Pirassununga é alvo de golpe e deposita mais de R$ 2 milhões em conta falsa
A falta de comunicação entre setores da Prefeitura de Pirassununga (SP) é a principal explicação para o município ter caído no golpe.
Um e-mail do golpista pedia para a prefeitura alterar dados de pagamento em nome da empresa Le Card, que administra o pagamento do vale. A empresa foi consultada e negou a mudança ao RH da prefeitura, alertando que se tratava de uma possível fraude. O RH, contudo, não avisou à contabilidade e o pagamento foi feito ao criminoso. (entenda a cronologia abaixo).
Está em andamento uma tentativa de reaver a quantia na Justiça, que inicialmente negou um pedido de urgência ao processo. Depois, uma liminar decidiu pelo bloqueio do valor no banco Rendimento.
A Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP) informou que o caso é investigado como estelionato em inquérito policial.
E-mail falso
A situação começou quando, em 3 de fevereiro, o setor de contabilidade da prefeitura recebeu um suposto e-mail da empresa contratada para administrar o vale-alimentação dos servidores municipais.
No texto, os golpistas, que se passavam pela empresa, pediram a alteração de dados bancários. (veja no print abaixo)
E-mail mostra golpistas se passando pela Le Card e pedido de alteração de conta para a Prefeitura de Pirassununga
Reprodução
A contabilidade municipal questionou o setor de recursos humanos sobre o pedido. O RH chegou a entrar em contato com a Le Card, que avisou se tratar de uma fraude, segundo afirmou ao g1 o diretor-financeiro da empresa, Gervando Thompson.
A informação, no entanto, não foi repassada do setor de recursos humanos à contabilidade.
“Teve essa troca de e-mails, só que os setores não se comunicaram. Teve um e-mail de uma repartição, que não falou com a outra. Realmente a empresa mandou uma mensagem dizendo que era para tomar cuidado com golpe. A falta de comunicação entre os setores ocasionou isso aí”, afirmou à EPTV, afiliada da TV Globo, o procurador-geral do município, Tiago Varisi.
A prefeitura informou que “a comunicação do alerta de possível golpe envolvendo a utilização indevida do nome a empresa não foi visualizada pela Tesouraria”.
‘Orientação’ dos criminosos
Confira a seguir o passo a passo do golpe:
Sem receber a comunicação do RH, o setor de contabilidade continuou trocando e-mails com os golpistas. E no dia 5 de fevereiro foi feito um primeiro pagamento, no valor de R$ 36, já para os criminosos. Eles chegaram a reclamar que o valor havia sido estornado e o setor de contabilidade alegou que havia divergência nos dados bancários.
No dia 6 de fevereiro, os responsáveis pelo golpe fizeram orientações com mais uma “isca” para a ação. (veja o print abaixo)
Mensagem enviada por golpistas ao setor de contabilidade de Pirassununga
Reprodução
A funcionária, também em 6 de fevereiro, respondeu dizendo: “Fiz com a opção correta, conforme comprovante em anexo”.
O pagamento principal, dos R$ 2,181 milhões, aconteceu em 12 de fevereiro. Neste dia, inclusive, os criminosos, primeiramente, reforçaram para que a contabilidade municipal fizesse a transferência na conta “correta”. (confira no print abaixo)
Com e-mail do gmail, golpista reforça pedido de pagamento para a Prefeitura de Pirassununga; R$ 2,1 milhões foram transferidos
Reprodução
Depois de cair no golpe, a Prefeitura fez a transferência certa à Le Card em 17 de fevereiro, conforme informações do Portal da Transparência. O município foi questionado, mas ainda não detalhou qual foi a “manobra” orçamentária feita para garantir o crédito.
À reportagem, o presidente do Sindicato dos Servidores da cidade, Éder Ricardo Pereira da Cruz, afirmou que, apesar da situação, os funcionários só demoraram seis horas a mais para receber o vale. “Normalmente recebem às seis horas da manhã. Estava provisionado, e aí quando foram usar pela manhã, não conseguiram. Mas, ao meio-dia, o dinheiro caiu”, explicou.
Denúncia ao BC
O diretor-financeiro da Le Card informou ao g1 que a empresa fez denúncia sobre o caso ao Banco Central e colabora com as investigações da polícia.
Em 31 de março, o Banco Rendimento, usado pelos golpistas, enviou nota à reportagem confirmando que a Le Card não tinha conta corrente ou relacionamento com a instituição bancária.
“Conforme apurado, a empresa tem uma conta digital na 7Trust Finance, instituição de pagamento em funcionamento de acordo com os normativos do Banco Central, que contratou os serviços do Banco Rendimento, para a liquidação de suas transações financeiras”, explicou.
A instituição bancária ainda acrescentou que “segue as regulamentações do Banco Central e está à disposição das autoridades para eventuais esclarecimentos”.
Prefeitura de Pirassununga teria recebido e-mail com informações falsas
Reprodução/EPTV
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Pedido de bloqueio na Justiça
Diante do ocorrido, a Prefeitura de Pirassununga fez um boletim de ocorrência, abriu protocolo administrativo para apuração de eventual fraude e pediu indenização por danos materiais contra o banco que permitiu a abertura da conta.
A princípio, o juiz Jorge Corte Júnior, da 3ª Vara de Pirassununga, indeferiu o pedido de urgência da Prefeitura e negou o bloqueio de valores da instituição bancária.
A justificativa do juiz foi de que o município “sequer indicou ao polo passivo a beneficiária das transferências indicadas” e de que diversos documentos, inclusive e-mails são citados, mas “sequer foram juntados aos autos, o que enfraquece a verossimilhança das alegações”.
Corte Júnior acrescentou que “não é impeditivo que as partes transijam e tragam eventual acordo para homologação judicial”. O juiz deu 15 dias para que a Prefeitura possa contestar a negativa e o município informou que “peticionou a reconsideração”.
Até que, em 31 de março, uma liminar do mesmo juiz decidiu pelo bloqueio do valor nas contas do banco.
“(…) considerando-se a responsabilidade objetiva do Banco réu e a probabilidade de que a conta tenha sido aberta para perpetrar uma fraude, entendo presentes os requisitos da tutela de urgência (CPC art. 300), até mesmo porque a robustez econômica do réu é muito maior que a do município, cujas finanças estão combalidas há anos, estando presente também o risco de dano de difícil reparação, uma vez que a matéria envolve questão de considerável alcance social, atinente ao vale alimentação dos milhares de funcionários municipais, defiro a tutela para que seja bloqueada junto às contas do Banco réu a importância de R$ 2.181.878,66”, escreveu Corte Júnior na decisão.
CEI na Câmara
Câmara Municipal de Pirassununga
Divulgação
A Câmara Municipal de Pirassununga (SP) abriu, em 1º de abril, uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar o golpe de R$ 2,181 milhões sofrido pela Prefeitura.
No requerimento de abertura, o vereador Carlos Luiz de Deus (MDB), o Carlinhos, citou que “o município procurou abafar o caso” e afirmou que “o administrador deve zelar pelos bens e não poderia ter realizado o pagamento de tamanha envergadura, tão somente por haver recebido e-mail da suposta Le Card”.
A vereadora Luciana do Lessio (Republicanos) foi escolhida como presidente da CEI e Carlinhos como relator. Os trabalhos da comissão tem prazo de conclusão de 120 dias, e prorrogáveis por mais 60 dias se houver aprovação em plenário.
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