Ex-ministra Nísia Trindade ministra aula inaugural na Fiocruz

No dia 7 de abril, a ex-ministra da Saúde Nísia Trindade, que é membra titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), foi convidada para ministrar a aula inaugural do ano letivo na Fundação Oswaldo-Cruz (Fiocruz), instituição que ela liderou durante a pandemia da covid-19. À frente da Fiocruz, Nísia foi responsável por fechar o acordo com a biofarmacêutica AstraZeneca e produzir nacionalmente um dos imunizantes responsáveis por tirar o Brasil da emergência sanitária.

A Acadêmica foi ovacionada pelo público presente no auditório do Centro Administrativo Vinicius Fonseca, em Bio-Manguinhos, no Campus Fiocruz, antes de começar sua aula intitulada “Ação global inclusiva frente aos desafios da saúde”. Ela começou traçando um paralelo da covid com a pandemia do HIV, na década de 80, que, segundo apontou, deu impulso à estruturação das agências internacionais de saúde e a um maior protagonismo da Organização Mundial da Saúde (OMS) na criação de agendas e políticas internacionais.

A HIV mostrou também como um olhar sociológico é fundamental para a compreensão de questões da área da saúde. A doença, no início, foi entendida como restrita à homens homossexuais e contribuiu para fortalecer o estigma e os preconceitos contra esse grupo já vulnerável. “Pandemias também funcionam como observatório para questões sociais”, refletiu Trindade.

Saltando no tempo, chegamos à covid-19, que trouxe consigo outros fatores e dilemas sociais não menos relevantes. A covid se apresentou ao mundo num momento de turbulência política e de transição comunicacional, com as redes sociais e a internet tomando a dianteira sobre os meios tradicionais de informação. “Houve uma dificuldade de estabelecer o que de fato tinha lastro científico”, afirmou a Acadêmica.

A desigualdade social também foi um problema escancarado pela pandemia. Apesar de a OMS ter aprovado, logo no início, uma resolução colocando vacinas e insumos como “bens públicos globais”, não foi isso o que aconteceu. A realidade que se impôs foi de uma corrida pelos imunizantes, onde países ricos conseguiram estocar vacinas em quantidades superiores até do que o necessário para suas populações, enquanto populações de países pobres definhavam. “A pandemia exacerbou desigualdades estruturais, lacunas e riscos sistêmicos que já existiam”, afirmou.

A crise também sobrecarregou os sistemas de saúde e de proteção social, atrapalhou a formação de milhões de alunos e causou perda de empregos em larga escala. Segundo Nísia Trindade, alguns dos aprendizados que ficam são a importância do investimento continuado em pesquisa e da descentralização da produção de insumos, além do fortalecimento dos órgãos multilaterais de governança global. “O instinto de auto-preservação que suplantou a solidariedade entre os países tornou evidente a necessidade de mecanismos pré-estabelecidos de cooperação internacional”, defendeu.

Segunda a Acadêmica, esses mecanismos devem ter como norte o compartilhamento de dados, pesquisas e tecnologias, o fortalecimento dos sistemas regionais de saúde e a ideia da Saúde Única – que entende a saúde do ambiente como indissociável da saúde humana. Ela citou como exemplo a Declaração do Rio de Janeiro, resultado da Cúpula do G20 de 2024, que estabeleceu as bases para a criação de uma coalizão internacional para o financiamento da produção local de vacinas, sobretudo nos países mais pobres.

Por fim, Nísia Trindade também saudou os esforços da Fiocruz para levar a ciência para além de seus muros, estimulando os pesquisadores a se preocuparem também com a comunicação da ciência que produzem.

Assista à aula completa:

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