Relembre o famoso (e odiado) tutorial de Driver e a teoria da “punição” sobre quem tinha a versão pirata

Sam Houser, um dos fundadores da Rockstar, tinha uma visão bem definida do que ele achava que havia se transformado a indústria dos games nos anos 90: surpreendentemente monolítica e confortável, ancorada em títulos que apostavam suas fichas apenas em contos heroicos e que careciam de originalidade.

Para combater isso, surgiu um projeto que seria transformador: Race ‘n’ Chase, projeto que virou GTA. Com uma narrativa cheia de referências a filmes de James Bond e cenas de perseguição como as de Operação França (The French Connection), entre outros.

Driver: o concorrente cinematográfico

Driver

Em 1999, ano de lançamento de GTA 2, outro game fisgou a atenção daqueles que também ansiavam por uma narrativa mais madura, e com uma bela pitada cinematográfica. Driver: You Are the Wheelman, ou simplesmente Driver.

O game também foi alçado a esse patamar de ser ousado e que também carregava uma bagagem de inspiração em filmes. Aliás, sua grande influência na sétima arte deu origem a um tutorial que fez muitos odiarem o jogo pela dificuldade — e também acendeu teorias de que o propósito era atrapalhar a vida dos pirateiros.

O cenário de 1999 nos games

Em 1999, a indústria de videogames vivia um grande momento, não só financeiro, mas também tecnológico, com o 3D deslanchando. Em termos de números, as vendas atingiram US$ 7,4 bilhões naquele ano — crescimento de 20% em relação ao ano anterior.

Nos consoles, a Sony, que adentrou nesse universo em 1994, nadava de braçadas, respondendo por 47% das unidades de hardware vendidas e 43% da receita do setor.

Entre os títulos, Pokémon liderava as vendas globais, com Pokémon Red/Blue/Yellow somando quase 10 milhões de cópias, seguido por Final Fantasy VII com 4,5 milhões, Pokémon Gold/Silver com 4,4 milhões, Super Smash Bros. com 2,82 milhões, Donkey Kong 64 com 2,64 milhões e Gran Turismo com 1,63 milhão.

O surgimento de Driver

O que provavelmente ninguém contava era que um novo título também apareceria nesse ranking, lá em décimo lugar, com cerca de 1,6 milhão de cópias — superando até mesmo GTA 2, que não teve o impacto do primeiro game. Esse título foi o Driver, desenvolvido pelo estúdio britânico Reflections Interactive e publicado pela GT Interactive.

Lançado no dia 25 de junho de 1999 para o PlayStation, o game colocava o jogador na pele do agente secreto John Tanner, que aceita missões ilegais para ganhar a confiança de criminosos e desmantelar uma organização por dentro, atuando como um infiltrado. Driver também ganhou versões para o Game Boy Color, PC, Macintosh e até mesmo iPhone, em 2009.

Cinema como inspiração

A narrativa, com todo esse ar cinematográfico, bebeu diretamente de fontes que o criador de Driver, Martin Edmondson, gostava desde criança. Driver foi fortemente inspirado em filmes de perseguição de carros dos anos 60 e 70, em particular The Driver, de 1978.

Neste filme, escrito e dirigido por Walter Hill e estrelado por Ryan O’Neal, há uma cena na qual o personagem de O’Neal exibe manobras precisas com um carro dentro de uma garagem.

O famigerado tutorial de Driver

Caso você tenha jogado Driver, provavelmente já lembrou que algo muito parecido estava presente no game. Era o grande (e infernal) cartão de visita para o jogador. Seu primeiro contato na pele de Tanner era um tutorial em que você tinha cerca de 60 segundos para cumprir uma lista de 10 manobras específicas listadas numa folha que aparecia no canto da tela.

As manobras iam desde fazer um 180 graus em ré, ziguezaguear entre colunas, giro de 360 graus, entre outras. Erros custavam tempo ou reprovação imediata. O game também não fazia muita questão de ser intuitivo e guiar o jogador. Era quase um “se vira aí e tente completar isso”.

O ódio era potencializado com o fato de que não era possível pular esse tutorial obrigatório, o jogador precisava passar para dar prosseguimento à história.

Teorias e lembranças

Esse tutorial foi responsável por criar toda uma mística em cima de Driver, um sinônimo de desafio a ser superado, além de ter se transformado em objeto de inúmeras discussões pela internet, com direito à teoria de que esse tutorial foi feito com o objetivo claro de “punir” quem tinha uma cópia pirata do jogo.

Não sei você, mas eu fui um que jogou a versão pirata de Driver, numa daquelas saudosas casas de consoles, em que você pagava um valor para jogar por um período de tempo. Lembro de ter tentado algumas vezes passar pelo tutorial (e fracassado em todas elas). Era algo realmente maçante, principalmente em relação à ausência de informações sobre como fazer determinada manobra.

A teoria mais comentada sobre isso — e que não há nenhum tipo de confirmação oficial dos envolvidos em Driver — é que isso seria uma medida que privilegiava aqueles que tinham o Driver original, já que a versão oficial contava com o manual que detalhava tudo o que tinha que ser feito em cada uma das manobras para passar pelo tutorial.

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Uma ajuda escondida

E também havia outra alternativa que não era muito explorada. Como relembra esse post de 2000 com um guia sobre o jogo, no menu principal havia um modo “training” separado (identificado por cones de trânsito), em que o jogador podia assistir a uma demonstração gravada de como concluir o desafio do tutorial.

Evidentemente, muitos jogadores não procuraram por isso e foram na base da tentativa e erro mesmo, o que tornava a experiência um teste de paciência que irritaria até um monge tibetano.

A intenção era dificultar?

Em entrevistas, o criador do game sempre fez questão de destacar que, em nenhum momento, passou pela cabeça deles que o tutorial seria algo encarado como dificílimo — a proposta não era essa. Edmondson chegou a dizer que considerava 60 segundos tempo de sobra para isso, já que nos testes internos a equipe conseguia completar em 25 segundos.

Bom, intencional ou não, esse famigerado tutorial foi um dos responsáveis por definir as características do game quando o relembramos.

Até Lewis Hamilton tentou (e falhou)

No ano passado, até o piloto Lewis Hamilton foi colocado à prova no tutorial. O resultado? Ele também não conseguiu passar.

Driver marcou época por ousar misturar ação, narrativa cinematográfica e desafio técnico. Seu infame tutorial se transformou em símbolo de resistência, piada interna entre jogadores e também, de certo modo, um filtro: quem superava aquele início, estava pronto para qualquer coisa!

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