Prêmios de “O agente secreto” em Cannes são marcos para o cinema brasileiro

O cinema brasileiro ganhou mais dois momentos históricos no  78º Festival de Cannes, que terminou neste sábado, dia 24: Kleber Mendonça Filho levou o prêmio de melhor direção por O agente secreto e, pelo mesmo filme, Wagner Moura venceu na categoria de melhor ator. As vitórias vêm reforçar o ótimo momento do audiovisual nacional, que ganhou seu primeiro Oscar com Ainda estou aqui, de Walter Salles, em março.

O Brasil não ganhava o troféu de direção em Cannes desde 1969, quando Glauber Rocha foi premiado por O dragão da maldade contra o santo guerreiro. E nunca o país tinha levado um prêmio de melhor ator em Cannes, só de atriz (Fernanda Torres, com Eu sei que vou te amar, em 1986, e Sandra Corveloni, com Linha de passe, em 2008). Os dois prêmios são apenas o sétimo e o oitavo do cinema nacional pelo júri oficial da competição do Festival de Cannes.

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“Meu país, o Brasil, é um país cheio de beleza, e eu estou orgulhoso de estar aqui nesta noite para receber este prêmio”, disse Kleber no discurso de agradecimento pelo troféu de direção. “Estou muito feliz. O Festival de Cannes é a catedral do cinema neste planeta. Muito obrigado aos meus produtores, que queriam que este filme fosse lançado nos cinemas. Foi o cinema que forjou o caráter deste filme.” Kleber frequenta o festival há décadas, desde os seus tempos de crítico de filmes. Nas salas de imprensa e de coletiva, os prêmios para O agente secreto foram aplaudidíssimos.

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Kleber Mendonça Filho e Wagner Moura.
Foto: Laura Castor

Em O agente secreto, Wagner Moura é Marcelo, um pesquisador universitário que foge para o Recife e quer reencontrar o filho, hoje morando com os avós maternos. O avô Alexandre (Carlos Francisco) é projecionista de um cinema de rua onde as pessoas, naquele sufocante ano de 1977, em meio a uma ditadura militar que não acabava mais, vão rir, gritar, extravasar. Na cidade, Marcelo se esconde de seus perseguidores em um condomínio e cruza com diversos personagens que dão o tom e a cor do Brasil daquela época.

Wagner Moura não pôde voltar a Cannes para receber seu prêmio de ator, pois está filmando em Londres o longa de ficção científica 11817, dirigido por Louis Leterrier, em que contracena com Greta Lee. Kleber representou o colega e recebeu o prêmio das mãos da atriz Rossy de Palma. Mas, na coletiva de imprensa dos premiados, incentivado pelo moderador Didier Allouch, o cineasta brasileiro ligou para o ator, que falou pelo viva-voz. “Queria muito estar aí com todos vocês. Estou aqui sozinho, tomando um copo de vinho em Londres. Não poderia estar mais feliz. Trabalhar com Kleber foi um dos momentos mais importantes da minha vida. Estava tentando trabalhar com ele fazia anos. Estou muito contente com a maneira como o filme foi recebido, porque é um filme brasileiro e significa muito para a cultura brasileira. É uma pena eu estar celebrando sozinho.” Sua fala foi aplaudida com entusiasmo.

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A segunda Palma de Ouro para o Brasil – a primeira e única foi para O pagador de promessas (1962), de Anselmo Duarte – ficou para outra vez. Mas nem dá para reclamar. O prêmio máximo deste ano foi para It was just an accident, do iraniano Jafar Panahi, que se inspirou em sua própria prisão com prisioneiros comuns para mostrar o dilema moral de um homem que acredita ter encontrado seu torturador.

Cineasta premiado, com um Leão de Ouro de Veneza por O círculo (2000) e o Urso de Ouro de Berlim por Táxi Teerã (2015), Panahi foi preso por protestar contra o ex-presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, proibido de filmar e de sair do país por 20 anos. Durante mais de uma década, os filmes que fez escondido, enquanto estava em prisão domiciliar, foram exibidos e premiados em festivais de cinema mundo afora sem sua presença.

It was just an accident é sua volta, depois do fim da proibição de filmar e viajar. Mas o cineasta não deixou de provocar e pode enfrentar novos problemas em seu retorno.

Mesmo assim, a disputa parece ter sido acirrada, como disse o diretor sul-coreano Hong Sang-soo na coletiva do júri ao justificar o prêmio duplo para O agente secreto: “Muitos de nós queríamos dar o prêmio máximo para ele. Wagner Moura é um ator de que gostamos muito e que mostra muita sensibilidade no papel. Nós gostamos muito de O agente secreto e decidimos dar dois prêmios.”

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